Já
há algum tempo que nós dois não temos mais a inocência de antes, aquela que há
entre duas pessoas que apenas cogitam, se imaginam tendo algo mais, nós ultrapassamos
esses limites, nossos antecedentes estão manchados para sempre. Somos agora
marcados pela tensão quando estamos juntos em público, receosos a todo tempo de
que alguém perceba demais, em uma dessas vezes em que olhamos no olho do outro
quando trocamos algumas palavras, no nosso jeito próprio de conversar, que
alguém descubra o que aconteceu naquela dia. Eu meço minhas palavras, tento
agir o mais normal possível, as vezes fico muda pra não dar brecha às
pessoas de nos observarem, nos estudarem, estudarem nossos gestos, a
inquietude que a proximidade nos gera, nossos risos meio presos, o olhar
distante enquanto regressa a memória daquela noite... e perceberem que houve
algo além desse nosso teatro. Mas aí voltamos a conversar, para não levantar
nenhuma suspeita e você fala da sua casa, encenando uma perfeita distração
na voz, como se eu não soubesse onde é, e eu finjo que não sei, finjo que nunca
estive lá. Minto! Por vezes fico tentada a te mandar uma mensagem, agoniada por
retomar nossa convivência de antes, e sentindo ao mesmo tempo medo de que você,
ao contrario de mim, esteja se esforçando em não repetir os erros que um dia cometemos. No entanto, basta
alguns poucos momentos a sós para se perceber que deixamos algo inacabado que
nos impede de regressar do ponto que paramos, nos impede de fingir para o outro
que não existiu. Nós somos cúmplices do mesmo crime, mantemos as aparências de
inocentes em frente as outras pessoas, mas quando estamos sozinhos nossas
conversas evidenciam o erro, nos incrimina! O jeito que nos portamos
mostra o que já fizemos, que sujamos nossas mãos juntos, que algo aconteceu. Há
uma intimidade que acobertamos, pois estamos fadados a transgressão, a praticar
todos os ilícitos que nos rodeiam, um crime no qual já estamos condenados a
reincidir!
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