A gente se dá tão bem assim, sendo amigos que nunca concordam, quando
somos confronto. A gente conversa batendo boca é assim o nosso jeito, o jeito
que sorrimos, que damos nossas risadas verdadeiras. A gente se entende na
contradição das palavras, é assim que fazemos sentidos, a nossa lógica é assim:
contrariando o outro em tudo. É desse jeito que vamos bem, falando tudo ao
inverso, é o nosso dialeto. Falamos sério brincando, brigamos sorrindo,
discutimos o tempo inteiro e terminamos numa boa!
Mas quando nos
inclinamos ao tratamento de casal, quando falamos a língua dos normais não nos
entendemos. Fico chata, sem assunto, sem piada. Ele: seco. Perdemos a graça, o
jeito. As palavras carinhosas de alguma forma se distorcem, as boas intenções
são incompreendidas e acabamos brigando, de verdade.
Ele não é a minha
paz, tampouco sou a dele. Embora ele diga que quer que fiquemos assim, a paz
que ele me traz é ao contrário também, ele só é calmaria quando estou num
turbilhão muito pior ou quando estamos em pé de guerra. Quando desejo ser doce
e carinhosa,sempre penso numa maneira ao avesso para demonstrar, no mínimo
termino ou começo a frase com um xingamento, uma crítica a ele, assim tudo se
encaixa e tem graça.
O único momento no
qual somos normais, um plágio barato de todas as outras pessoas é quando ficamos
juntos, só eu e ele. Aí sim, não temos
nenhuma autenticidade, nada de excepcional. Somos mãos dadas, carinho, chamego, sorrisos e
olhares, cuidado... quando nos entregamos feito amantes, somos isso, sem nenhuma
novidade, a não ser pra nós mesmos, porque queremos agradar o outro, confiamos
nossa intimidade ao outro, somos parceiros, cúmplices, casal. Um clichê dos
bons! Fora isso estamos sempre na contramão do outro, nos entendendo no
desentendimento, no cinismo.
Mas aí, um dia do nada, ele começa uma briga por causa de um sonho
meu com outro cara, totalmente sem importância, como se fôssemos mais, como se
fosse um tipo estranho de ciúme, que eu nem entendo direito, porque nunca nos
encaixamos nessa posição de casal, nunca fizemos esse tipo.
E aí eu penso que
já vi tantas histórias de pessoas que seguiram o ritmo e as fases normais para
se tornarem casal e acabaram mal, e já vi também histórias improváveis, que começaram
tortas e deram certo que seria hipocrisia minha dizer que essa idéia da gente
não me agrada. Seria falsidade dizer que não o imagino desse jeito, que nunca
pensei que poderia ser a gente um desses casais estranhos, imperfeitos...
porque de alguma forma já aceitei a ideia, já gostei sem saber bem como ela
entrou nos meus devaneios, que o meu coração já quis isso antes mesmo de eu
imaginar. E não seria surpresa se estivermos fazendo tudo ao contrário, se
estivermos começando pelo fim, brigando tanto pra nos amarmos no final, porque
somos o antônimo perfeito do outro, algum amor já deve haver.
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